• O TRT, ao analisar as provas, entendeu pela culpa exclusiva do trabalhador, o que exclui a responsabilidade objetiva da empresa.

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão que concluiu pela culpa exclusiva de um ajudante geral no acidente em que perdeu o polegar direito durante atividade na Bloco Renger Indústria Comércio Serviços de Engenharia Ltda, em Campinas (SP). Com a decisão, a empresa não indenizará o empregado, reabilitado pelo Instituto Nacional do Seguro Social para exercer a função de porteiro após o período de afastamento com auxílio-doença acidentário.

A Sexta Vara do Trabalho de Campinas condenou a empresa a pagar indenização de R$ 25 mil e R$ 3,5 mil, por danos morais e estéticos respectivamente, e pensão vitalícia por danos materiais. O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP), porém, absolveu a empresa.

Para o TRT, a responsabilidade pelo acidente foi somente do empregado, que, mesmo com os treinamentos e a fiscalização da empresa (comprovados por depoimentos de testemunhas), operou manualmente a máquina ligada, “transgredindo regras utilizadas corriqueiramente”.

No TST, o empregado insistiu na responsabilidade objetiva da empresa, alegando que não recebeu treinamento adequado. Segundo ele, se a máquina tivesse sensor e barra de proteção, o acidente teria sido evitado.

O relator do recurso, ministro Douglas Alencar Rodrigues, destacou que a Sétima Turma tem aplicado a teoria do risco nas ações da construção civil, mas, no caso, o TRT, ao analisar as provas, entendeu pela culpa exclusiva do trabalhador, o que exclui a responsabilidade objetiva da empresa. Como o TRT se baseou nas provas, para se ter outro entendimento seria necessário reanalisá-las, o que é vedado pela Súmula 126 do TST.

Após a publicação do acórdão, a empresa interpôs embargos à Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), ainda não analisados.

FONTE: Notícias do Tribunal Superior do Trabalho – www.tst.jus.br

 

ACORDÃO:

 

RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DO TRABALHO. INOBSERVÂNCIA DAS REGRAS PARA OPERAÇÃO DO EQUIPAMENTO DE PRODUÇÃO DE PISOS E BLOCOS DE CONCRETO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA RECLAMADA NÃO RECONHECIDA. Esta Sétima Turma tem decidido que, nas atividades relacionadas à construção civil, aplica-se a teoria do risco ou responsabilidade objetiva do empregador, nos termos do parágrafo único do art. 927 do CCB, hipótese em que se examina apenas a ocorrência do dano e da presença do nexo de causalidade. Na situação dos autos, o Tribunal Regional registrou que o empregado, ao operar a máquina de fabricação de pisos e blocos de concreto, não observou as normas de segurança – retirou os restos de produto do interior da máquina sem fazer uso da pá e sem desligar o equipamento -, vindo a sofrer o acidente do trabalho, que ocasionou a perda do polegar direito e da metade do indicador direito. Consignou, ainda, com base no conjunto fático-probatório, o cumprimento das normas de medicina e segurança do trabalho por parte da empresa, que orientava, oferecia treinamentos, fornecia equipamentos de proteção adequados ao exercício da função e fiscalizava o uso. Reconheceu, assim, a ocorrência de culpa exclusiva da vítima pelo infortúnio. A moldura fática retratada no acórdão regional afasta o reconhecimento da responsabilidade objetiva da Reclamada, porquanto a culpa exclusiva do empregado pela ocorrência do acidente constitui circunstância excludente do nexo causal e, consequentemente, da obrigação de indenizar. Ausência de violação dos artigos 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da CF, 927, parágrafo único, e 950 do CC e 21-A da Lei 8.213/91. Arestos inespecíficos, visto que não possuem identidade fática com o caso concreto, na forma exigida pela Súmula 296, I, do TST. Recurso de revista não conhecido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-119900-74.2005.5.15.0093, em que é Recorrente J. H. M. e Recorrido BLOCO RENGER INDÚSTRIA COMÉRCIO SERVIÇOS DE ENGENHARIA LTDA. O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, mediante acórdão às fls. 423/431, complementado às fls. 445/450, deu provimento ao recurso ordinário interposto pela Reclamada e negou provimento ao recurso ordinário interposto pelo Reclamante. Inconformado, o Autor interpõe recurso de revista (fls. 453/466). Admitido o recurso às fls. 495/496. Contrarrazões às fls. 499/514. Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho (art. 83, III, do Regimento Interno do TST). É o relatório. V O T O 1. CONHECIMENTO

Satisfeitos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passo ao exame dos pressupostos intrínsecos do recurso de revista. 1.1 ACIDENTE DO TRABALHO O Tribunal Regional assim decidiu:

“DO ACIDENTE DE TRABALHO. DAS INDENIZAÇÕES REPARATÓRIAS DE DANOS MORAIS, MATERIAIS E ESTÉTICOS Trata-se a presente de ação para a reparação de danos morais, materiais e estéticos, fundada em responsabilidade civil, decorrente de acidente de trabalho. Conforme os ensinamentos de Octávio Bueno Magano, em sua obra Lineamentos de infortunística (1976, pp. 30 e 37), “Acidente de Trabalho é o evento verificado no exercício do trabalho de que resulte lesão corporal, perturbação funcional ou doença que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho”. Tomando como base esse conceito, são identificadas, portanto, as seguintes características: a) evento danoso; b) decorrente do exercício do trabalho a serviço da empresa; c) que provoca lesão corporal ou perturbação funcional; d) que causa morte ou a perda (ou redução) da capacidade para o trabalho (permanente ou temporária). Ou seja, em síntese, é necessário o fato, que entre a atividade do empregado e o acidente haja uma relação de causa e efeito, o que chamamos de nexo etiológico ou nexo causal; além dos demais fatores citados acima. A responsabilidade civil em razão de acidente de trabalho está calcada na Constituição Federal que assegura aos trabalhadores, no seu art. 7º, inciso XXVIII , o direito ao seguro contra acidentes do trabalho, sem excluir a indenização a que o empregador está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa. Além disso, encontra alicerce também no artigo 186 do Código Civil, o qual estabelece que aquele que violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilícito. Há doutrinadores, em minoria, que chegam a entender que a responsabilidade, em se tratando de acidente de trabalho, é “objetiva”; todavia, verifica-se, de forma patente, que tanto a Constituição Federal como o Código Civil filiaram-se expressamente à teoria “subjetiva”, erigindo o dolo e a culpa como fundamento para a obrigação de reparar o dano. Exige-se, pois, do lesado, para vencer a demanda, que demonstre: (I) a ação ou omissão do agente, (II) a existência do dano e do nexo de causalidade, e, ainda, que prove (III) a culpa ou o dolo do réu.

Assim, para que o empregador seja responsabilizado pela reparação civil do dano sofrido pelo empregado, mister se faz que seja provado, adequada e concretamente, que a lesão sofrida adveio de conduta ativa, dolosa ou culposa do empregador. Não subsistirá o dever do empregador de indenizar se o dano resultante de acidente advém de culpa exclusiva da vítima ou se não demonstrada a culpa do empregador e o nexo de causalidade. Feitas essas considerações e diante de todas as premissas lançadas, passa-se à análise fática da hipótese vertente e, por conseguinte, da aplicação de todo o arcabouço formado acima. Não obstante o quão fundamentada esteja a r. decisão primeva, com ela não se pode assentar, seja porque não se pode admitir a responsabilidade objetiva da reclamada em caso de acidente do trabalho, por falta de amparo legal, seja porque restou cabalmente comprovado nos autos que a reclamada cumpria as normas de higiene e segurança previstas para a atividade realizada. Para tanto, impende a análise minuciosa da prova produzida nos autos, a fim de se extrair os escorreitos pontos a elucidar a celeuma posta em juízo. Restou incontroverso nos autos a ocorrência de acidente do trabalho (haja vista a emissão da CAT pela empresa – fls. 18/20, e o afastamento do autor em razão de auxílio-doença acidentário – fls. 23/24, tendo sido, após, reabilitado pelo INSS para executar a função de porteiro) e a existência de lesão em razão do acidente (amputação do dedo polegar direito). Resta definir, no entanto, se o reclamante demonstrou que a reclamada concorreu, com culpa ou dolo, para o evento danoso. E, de plano, verifica-se que não. Senão, vejamos: Em primeiro lugar, constata-se, a teor do laudo pericial, que as atividades desenvolvidas pelo reclamante, na reclamada, consistiam, basicamente, em tirar blocos e pisos das gaiolas e colocá-los nos pallets; além de recolher, com uma pá, a massa que caía fora da máquina de fabricar pisos e blocos. A ação de despejar massa com a pá de novo na máquina era realizada após umedecê-la, para moldá-la melhor e, com isto, evitar perda de material. Quando não realizava nenhuma das ações descritas, entregava blocos e pisos em diversos locais fora da empresa (vide fl. 212).

Observe-se, ainda, de acordo com o laudo pericial, que o infortúnio acometeu o autor quando este foi retirar massa da máquina, não obstante esta encontrar-se em pleno movimento, sendo que, imediatamente após o acidente, foi levado para a Unicamp, onde foi atendido na emergência (vide fl. 213). Isto posto, temos que o reclamante, deliberadamente, ignorou a determinação da empresa de utilizar-se da pá de cabo longo para a realização do procedimento, sem, sequer, desligar a máquina de fabricar pisos e blocos. Deixou, pois, de observar procedimentos de segurança, optando pelo uso manual, transgredindo regras utilizadas corriqueiramente. Veja-se, pois, que o Sr. Perito Judicial constatou que a informação prestada pelo autor, de que não foi treinado ou orientado para trabalhar nas máquinas de fazer pisos e blocos, foi contestada pelo diretor de produção. Registrou, outrossim, o Sr. Vistor, que três funcionários da produção, que estavam trabalhando no local da máquina de fabricar pisos, informaram que sempre que têm que tirar a massa da máquina, eles a desligam, o que conflita com as informações do reclamante (vide fls. 213/214). Muito esclarecedor, também, é o depoimento da testemunha arrolada pela reclamada, Sr. G. B. S., encarregado de produção, com passagens que merecem ser destacadas, in verbis: Depoimento: “trabalha na reclamada desde 1992 como encarregado de produção; que já trabalhou na máquina do acidente como operador de máquina; exercendo a mesma função do reclamante no dia do acidente; que não presenciou o acidente; que presenciou o reclamante trabalhando na máquina antes do acidente, em torno de 03 vezes por semana; (…) que o reclamante e depoente, quando admitidos, receberam treinamentos referentes ao funcionamento das máquinas; que o treinamento foi dado pelo proprietário da empresa, Sr. José Carlos; que a máquina em que ocorreu o acidente necessitava de três empregados para operá-la; que um era operador de máquina, um trabalhava no braço mecânico e o último pondo a chapa no equipamento, que a mesma pessoa que põe a chapa no equipamento põe a massa com a pá; que no dia do acidente, sabe que o reclamante trabalhava na máquina colocando chapa; que no caso de encavalamento das chapas ou obstrução da gaveta a empresa instruía os empregados a desligarem a máquina; que os restos de cimento eram colocados na máquina com a pá do cabo longo; que a empresa fiscaliza a utilização de EPI’s, através da CIPA; que o único acidente (…) desde a sua admissão foi com o reclamante; que o reclamante desenvolve a contento sua função de porteiro na reclamada (…)” (fls. 274/275 – g.n.). Já os depoimentos das testemunhas obreiras não oferecem a mesma coerência, tanto que o MM. Juízo primevo, observando a flagrante contradição entre as declarações prestadas pelo autor e sua primeira testemunha, determinou a expedição de ofícios à gerência regional do MTE e do MPF. Não bastasse, a documentação encartada aos autos comprova que a empregadora instruiu o reclamante sobre sua função desde o dia de sua admissão. Atente-se que consta, já do contrato de experiência firmado com o autor, a seguinte cláusula: “O empregado fica ciente do Regulamento da Empresa e das Normas de Segurança que regulam suas atividades na Empregadora, e se compromete a usar os equipamentos de segurança fornecidos, sob pena de ser punido por falta grave, nos termos da Legislação vigente e demais disposições inerentes à segurança e medicina do trabalho.” (fl. 59 – g.n.). E os documentos de fls. 141/157 e 158/206 ainda revelam a implantação de PPRA – Programa de Prevenção de Riscos Ambientais e PCMSO – Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional na reclamada. Nessa esteira, comprovado está que a reclamada observava as normas de higiene e segurança no trabalho, não se constatando negligência em sua conduta. E mais, quanto à utilização dos equipamentos de proteção individual (EPI’s), o Sr. Perito esclareceu que estes eram fornecidos ao laborista, sendo adequados à sua função (cf. fls. 65/66 e 215/216). Demonstra-se, portanto, que a reclamada não apenas fornecia os equipamentos de segurança indispensáveis para a total segurança dos obreiros, mas também exigia e fiscalizava sua utilização, além de ministrar treinamento para o exercício de cada função, o que nos conduz à inevitável conclusão de que ela não detém culpa, exclusiva ou compartilhada com o trabalhador, pelo acidente, não cabendo, aqui, imputar-lhe a responsabilidade objetiva, não albergada por nossa Carta Magna. Nesse sentido já decidiu esta 12ª Câmara:

Por fim, ressalte-se que é dever do juiz assegurar às partes igualdade de tratamento, como institui o artigo 125, inciso I, do CPC, sendo defeso ao magistrado responsabilizar a reclamada pelo infortúnio ocorrido com o obreiro, sem prova hábil para tanto. No que concerne ao critério de distribuição do onus probandi, vigora o princípio da igualdade das partes, não se justificando, portanto, uma interpretação mais favorável ao reclamante quanto ao encargo probatório. Logo, reforma-se a r. decisão da origem, revogando-se a condenação da ré ao pagamento de indenizações por danos morais, materiais e estéticos.” (fls. 425/429). Em seu recurso de revista, afirma o Reclamante que restou incontroverso o acidente do trabalho, que acarretou a perda do polegar direito e da metade do indicador direito. Diz que deve ser reconhecida a responsabilidade objetiva da Reclamada, uma vez que sua atividade preponderante é a fabricação de “artefatos de concreto, cimento, fibrocimento, gesso e estuque” (fl. 462). Destaca que restou demonstrada a culpa da Demandada. Anota que “o acidente não ocorreria se o Recorrente tivesse treinamento adequado, bem como, se a máquina de fazer pisos que ocasionou o acidente tivesse sensor e barra de proteção” (fl. 458). Alega que faz jus à indenização por danos materiais, morais e estéticos. Aponta violação dos artigos 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da CF, 927, parágrafo único, e 950 do CC e 21-A da Lei 8.213/91. Transcreve arestos. Ao exame. A insuficiência da teoria da culpabilidade para dar solução aos inúmeros casos de vítimas de acidentes levou à criação da teoria do risco, segundo a qual o dono do negócio é o responsável por riscos ou perigos que sua atividade promova, ainda que empregue toda diligência para evitar o dano. Trata-se da denominada teoria do risco criado.

Em sendo o empregador responsável pela organização da atividade produtiva, beneficiando-se do lucro do empreendimento, nada mais razoável e justo do que lhe imputar a responsabilidade pelo ressarcimento ao obreiro dos danos decorrentes de sua exposição ao foco de risco, independentemente de cogitação acerca da imprudência, negligência ou imperícia. Assim anota Rui Stocco: “Significa que a periculosidade é ínsita à própria atividade, com força para dispensar qualquer outra indagação para impor a obrigação de reparar, devendo aquele que exerce ocupação, profissão, comércio ou indústria perigosa assumir os riscos dela decorrentes, pois mesmo sabendo da potencialidade ou possibilidade de danos a terceiros, ainda assim optou por dedicar a esse mister.” (Tratado de responsabilidade Civil, Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 167). Aliás, é inerente à própria concepção de empregador a assunção dos riscos da atividade econômica, conforme já previa a legislação trabalhista (CLT, art. 2°). No momento em que o empreendedor põe em funcionamento uma atividade empresarial, ele assume todos os riscos dela inseparáveis, inclusive a possibilidade de acidente do trabalho. Por definição, risco é a ameaça de lesão, envolvendo a possibilidade de que o evento danoso venha a ocorrer. De fato, a exposição do empregado a um ambiente de risco potencial, por força da natureza da atividade ou do seu modo de execução, o coloca em condição permanente de vulnerabilidade. A Constituição Federal assegura ao trabalhador o direito a desenvolver suas atividades em ambiente seguro que preserve sua vida, saúde, integridade física e moral, sendo certo que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente, dentre as quais se insere o ambiente do trabalho, sujeita o causador do dano a suportar as consequências sem se perquirir sobre a culpa (art. 225, § 3°). A professora e Magistrada Maria Zuíla Lima Dutra argumenta, verbis:

“A teoria da responsabilidade sem culpa se impõe pela necessidade de socialização do direto, pois aos interesses individuais se sobrepõem os interesses da ordem social, significando dizer que a opção pela teoria do risco representa a defesa da justiça social e da dignidade do ser humano. É nesse sentido que o jurista brasileiro Aguiar Dias afirma que ‘a teoria do risco é nitidamente democrática”. (Responsabilidade Objetiva do Empregador, Revista do TRT 8ª Região, Jul/Dez/2004, P. 38). Todavia, a regra geral da responsabilidade subjetiva inscrita no art. 7°, XXXVIII, da Carta Magna, fundada essencialmente na teoria da culpa, continua em pleno vigor, devendo, porém, ser interpretada em harmonia com a teoria do risco, sempre que cuidar de atividades perigosas. Sobre esse aspecto, vale colher nova lição de Rui Stoco: “Comporta admitir que, inobstante o grande entusiasmo que a teoria do risco despertou, o certo é que não chegou a substituir a culpa nos sistemas jurídicos de maior expressão e nem poderia assim ser. O que se observa, como ressuma da obra de Caio Mário, é a convivência de ambas: a teoria da culpa impera como direito comum ou regra geral básica da responsabilidade civil, e a teoria do risco ocupa os espaços excedentes, nos casos e situações que lhe são reservado.” (Tratado de Responsabilidade Civil, Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 151). Com efeito, só excepcionalmente, nos casos em que a atividade empresarial se desenvolve em um ambiente que implique risco para direitos de outrem, cogitar-se-á da aplicação da teoria do risco, cumprindo ressaltar que no contexto desta Justiça Especializada está-se diante de norma mais favorável ao trabalhador e compatível com o princípio protetivo que informa o direito do trabalho. Nessa perspectiva, dar interpretação diversa à norma constitucional é atentar contra a dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático de Direito. Sobre o tema, esta 7ª Turma tem decidido que, nas atividades relacionadas à construção civil, aplica-se a teoria do risco ou responsabilidade objetiva do empregador, nos termos do parágrafo único do art. 927 do CCB, hipótese em que se examina apenas a ocorrência do dano e da presença do nexo de causalidade. Nada obstante, no presente caso, ainda que evidenciada a atuação da empresa em atividade de risco – fabricação de “artefatos de concreto, cimento, fibrocimento, gesso e estuque” (fl. 462) -, não há falar em imputação da responsabilidade objetiva. Emerge do acórdão regional que as atividades desenvolvidas pelo Reclamante consistiam em “tirar blocos e pisos das gaiolas e colocá-los nos pallets; além de recolher, com uma pá a massa que caía fora da máquina de fabricar pisos e blocos. A ação de despejar massa com a pá de novo na máquina era realizada após umedecê-la, para moldá-la melhor e, com isto, evitar perda de material. Quando não realizava nenhuma das ações descritas, entregava blocos e pisos em diversos locais fora da empresa” (fl. 426). Observo, ademais, que o acidente ocorreu no momento em que o Autor foi “retirar massa da máquina, não obstante esta encontrar-se em pleno movimento” (fl. 426). Com efeito, consta do acórdão regional que o obreiro, “deliberadamente, ignorou a determinação da empresa de utilizar-se da pá de cabo longo para a realização do procedimento, sem, sequer, desligar a máquina de fabricar pisos e blocos. Deixou, pois, de observar procedimentos de segurança, optando, pelo uso manual, transgredindo regras utilizadas corriqueiramente” (fl. 426). Aflora, ainda, que o empregado recebeu treinamentos acerca da operação da máquina, do uso da pá para colocar e remover produtos do interior da máquina, bem como no sentido de que a máquina deveria estar desligada, ao se remover os restos de material do seu interior. Também foi registrado o cumprimento das normas de medicina e segurança do trabalho pela empresa, por meio de orientações, treinamentos, fornecimentos de equipamentos de proteção individual adequados para o exercício da função e fiscalização do correto uso. Com base nesses elementos, a Corte a quo reconheceu a ocorrência de culpa exclusiva da vítima pelo infortúnio.

De fato, a moldura fática retratada no acórdão regional afasta o reconhecimento da responsabilidade objetiva da empresa Reclamada, uma vez que a culpa exclusiva do empregado pela ocorrência do acidente constitui circunstância excludente do nexo causal e, consequentemente, da obrigação de indenizar. Nesse sentido, os seguintes julgados desta Corte: “EMBARGOS DOS RECLAMANTES – ACIDENTE DE TRABALHO – MOTORISTA DE ÔNIBUS – RESPONSABILIDADE OBJETIVADA RECLAMADA AFASTADA – CULPA EXCLUSIVA DO EMPREGADO CONDUTOR (-DE CUJUS-) – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA. 1. A decisão embargada assentou que o legislador brasileiro, por meio do parágrafo único do art. 927 do Código Civil, contemplou a possibilidade de responsabilização objetiva, ou seja, independente de culpa, daquele que causar dano a outrem, aplicando-se tal dispositivo, também na seara trabalhista, àqueles casos em que o trabalhador desempenhar, por ordem de seu empregador, atividade que inerentemente lhe traga riscos. Contudo, entendeu a Turma julgadora que, na hipótese dos autos, ante a constatação pelo Regional de que houve culpa exclusiva da vítima para a ocorrência do evento danoso, resta descaracterizado o nexo causal entre o acidente e a atividade desenvolvida pelo -de cujus-, elemento necessário à responsabilização objetiva da Reclamada. 2. Nos termos do art. 894, II, da CLT, com a atual redação conferida pela Lei 11.496/07, o trânsito dos embargos somente se viabiliza ante a indicação de decisões de Turmas que divergirem entre si, ou das decisões proferidas pela Seção de Dissídios Individuais, salvo se a decisão recorrida estiver em consonância com súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho ou do Supremo Tribunal Federal. 3. Por outro lado, também não prospera o recurso pela senda da divergência jurisprudencial, na medida em que os paradigmas apresentados pelos Embargantes desservem à comprovação do dissenso pretoriano, a teor do que dispõem a Súmula 296, I, e a OJ 95 da SBDI-1, ambas do TST. Embargos não conhecidos.” (E-ED-RR – 39200-87.2007.5.09.0585, Data de Julgamento: 14/11/2013, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 06/12/2013) “AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DE TRABALHO. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. Segue-se o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que a culpa exclusiva da vítima afasta por completo qualquer responsabilidade do empregador. Trata-se, pois, de excludente de responsabilidade do empregador incidente tanto nas hipóteses de responsabilidade objetiva quanto de responsabilidade subjetiva. Portanto, na espécie, apesar de o perito judicial ter concluído que o infortúnio ocorreu devido às condições inseguras de trabalho, infere-se do contexto fático-probatório delineado no acórdão que o empregado foi ao mesmo tempo imprudente e negligente no desempenho de suas atividades laborais, decorrendo exclusivamente desse descuido o acidente de trabalho. Desta feita, não se vislumbram as alegadas violações legais e constitucionais, além de inespecífica a divergência jurisprudencial (TST, Súmula nº 296, I). Agravo de instrumento desprovido.” (AIRR – 1299-26.2010.5.02.0472, Data de Julgamento: 15/10/2014, Relator Ministro: Arnaldo Boson Paes, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/10/2014) “AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DE TRABALHO. MORTE DO TRABALHADOR. AÇÃO AJUIZADA PELA VIÚVA E PELOS FILHOS DO EMPREGADO FALECIDO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FATO EXCLUSIVO DA VÍTIMA. MATÉRIA FÁTICA (SÚMULA 126). DECISÃO DENEGATÓRIA. MANUTENÇÃO. O fato da vítima (impropriamente denominado como culpa da vítima no CCB – art. 936) é fator excludente da reparação civil, por inexistência de nexo de causalidade do evento danoso com o exercício da atividade laboral. Nesse norte, a caracterização da culpa exclusiva da vítima é fator de exclusão do elemento do nexo causal para efeito de inexistência de reparação civil no âmbito laboral quando o infortúnio ocorre por causa única decorrente da conduta do trabalhador, sem qualquer ligação com o descumprimento das normas legais, contratuais, convencionais, regulamentares, técnicas ou do dever geral de cautela por parte do empregador. Também é excludente da responsabilidade, por quebra do nexo causal, nas hipóteses de responsabilidade objetiva. No caso concreto, o Tribunal Regional manteve a r. sentença que havia julgado improcedentes os pedidos indenizatórios, por considerar que o acidente foi provocado por ato inseguro do trabalhador, sem qualquer responsabilidade da Reclamada. Após exame da prova dos autos, a Corte de origem relatou que o de cujus, por motivos desconhecidos, pegou a motosserra de uso exclusivo de outro empregado e passou a cortar árvores, mesmo sem autorização para tal, causando o acidente que acabou por vitimá-lo. O Órgão a quo entendeu que a culpa pelo acidente, frente ao labor desprotegido e a execução de atividade não autorizada pela Reclamada – corte de árvores -, de fato, foi do empregado falecido. Enfatizou, ainda, a Corte de origem que havia o fornecimento do EPI adequado – capacete e botas – não tendo o de cujus dele se utilizado -porque não quis-, conforme prova testemunhal. Concluiu, portanto, o Tribunal Regional que foi a imprudência do ex-empregado, a sua falta de precaução e o seu ato inseguro que causaram o infortúnio. Assim, ainda que a atividade do de cujus possa ser considerada de risco, a Corte de origem consignou a existência de fator excludente da responsabilidade, mesmo que se trate de responsabilidade objetiva. Os dados fáticos relatados apontam para a existência de fato da vítima, já que a conduta do empregado falecido de exercer atividade não autorizada pela Reclamada e de laborar desprotegido, mesmo com o devido fornecimento de EPI, segundo se extrai do acórdão regional, foi decisiva para a ocorrência da lesão. Ante o contexto fático explicitado pelo Tribunal Regional, para reverter a decisão seria imprescindível o revolvimento de conteúdo fático-probatório, o que não é viável nesta instância recursal (Súmula 126/TST). Nesse quadro, decidindo a Instância Ordinária, pela sentença e pelo acórdão, que a prova dos autos evidencia fato exclusivo da vítima para a ocorrência do acidente, torna-se inviável, em recurso de revista, revolver a prova para se chegar a conclusão diversa (Súmula 126, TST). Assim, não há como assegurar o processamento do recurso de revista quando o agravo de instrumento interposto não desconstitui a decisão denegatória, que ora subsiste por seus próprios fundamentos. Agravo de instrumento desprovido.” (AIRR – 119100-91.2005.5.12.0008, Data de Julgamento: 08/10/2014, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 10/10/2014) “AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. ACIDENTE DE TRABALHO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. MATÉRIA FÁTICA. 1. Hipótese em que o Regional, embasado nas provas dos autos, afasta a responsabilidade civil da empregadora, por acidente de trabalho, por caracterizada a culpa exclusiva da vítima. 2. A pretensão recursal é de reconhecimento do direito à indenização por dano moral e material, defendendo-se a aplicação da responsabilidade objetiva. 3. Todavia, mesmo na hipótese de adoção da teoria do risco, a culpa exclusiva da vítima constatada (e imutável por força da Súmula 126, do TST), porque rompe o próprio nexo de causalidade, e com isso, exclui a responsabilidade civil, o que torna indevida quaisquer indenizações. 4. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento.” (AIRR – 975-59.2011.5.02.0065, Data de Julgamento: 01/10/2014, Relatora Ministra: Sueli Gil El Rafihi, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 03/10/2014) Definitivamente, a conclusão explicitada pelo Tribunal Regional, no sentido de que o empregado foi o único responsável pelo grave acidente que sofreu, elide a obrigação da Reclamada de reparar os danos correspondentes. Em atenção às razões recursais, esclareço que, para acolher a tese relativa à falta de treinamento adequado e a tese no sentido de que se a máquina estivesse equipada com sensor ou barra de proteção o acidente não teria ocorrido, seria necessário o revolvimento do quadro fático-probatório, procedimento vedado nesta esfera recursal extraordinária, nos termos da Súmula 126 do TST. Em suma, ausente o nexo de causalidade entre o acidente e a conduta patronal, inviável o reconhecimento da responsabilidade objetiva do empregador, não havendo falar em violação dos arts. 5º, V e X, e 7º, XXVIII, da CF, 927, parágrafo único, e 950 do CC e 21-A da Lei 8.213/91.

Demais disso, os arestos às fls. 464/465, originários dos TRTs da 9ª, 16ª e 17ª Regiões mostram-se inespecíficos, por não partirem da mesma premissa fática consignada na decisão recorrida. De fato, enquanto na decisão a quo, a Corte Regional configurou a culpa exclusiva da vítima pela ocorrência do acidente, os precedentes transcritos limitam-se a apontar a atividade de risco do empregador (Súmula 296, I, do TST). NÃO CONHEÇO. ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso de revista. Brasília, 8 de Abril de 2015.

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