A 4ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalha da 15a Região aumentou para R$ 10 mil o valor da indenização por danos morais que um maquinista de locomotiva de uma grande empresa do ramo ferroviário deveria receber por ter sofrido com a falta de sanitários durante o tempo que trabalhou para a reclamada. O Juízo da 2ª Vara do Trabalho de São José do Rio Preto havia arbitrado em R$ 5 mil a indenização, mas o trabalhador não concordou e recorreu.
Segundo os argumentos do maquinista, a falta de banheiro fez com que ele permanecesse “largo tempo exposto a situação humilhante”, que de fato foi reconhecida em sentença. Em sua tese, defendeu ainda que “o empreendimento da acionada é extremamente lucrativo”, o que não justifica, segundo ele, o valor insuficiente arbitrado, pelo que pede reparação em R$ 288.918,74.
A empresa se defendeu, afirmando que as locomotivas possuem sanitários, os quais poderiam ser utilizados pelo maquinista a qualquer momento. Ela também sustentou a tese da prescrição trienal da indenização por danos morais, visto que o reclamante informou que sua promoção como maquinista (momento em que a situação vexatória teria se iniciado) ocorreu em primeiro de outubro de 2010, ao passo que a presente demanda foi protocolizada em 17/12/2013.
Para o relator do acórdão, desembargador Luiz José Dezena da Silva, os argumentos da empresa são “absolutamente sem acerto”. O colegiado afirmou que, de fato, o maquinista descreveu que “sua promoção ocorreu na data referida e que, a partir de então, passou a se expor a situação constrangedora, consubstanciada na impossibilidade de acesso a instalações sanitárias no decorrer do labor, o que se prolongava, segundo disse, até a propositura da presente demanda (o contrato estava em curso)”.
Para o colegiado, “é evidente que a lesão não ocorreu em primeiro de outubro de 2010 precisamente, mas sim se prolongou até o presente, pelo que não há como se contar o prazo prescricional a partir daquele marco”. Por isso, negou os argumentos da empresa quanto ao reconhecimento da prescrição da pretensão de indenização por danos morais.
Com relação aos danos morais propriamente ditos, a empresa argumentou que o maquinista tinha acesso a instalações sanitárias existentes nas próprias máquinas conduzidas e nas diversas estações em que param as composições. O acórdão, porém, ressaltou que “a prova dos autos é consistente na demonstração dos fatos narrados” pelo trabalhador. A testemunha do reclamante, por exemplo, afirmou que “algumas locomotivas têm banheiros, mas não funcionam”, e que “as estações que têm banheiros são São José do Rio Preto e Santa Fé do Sul”, e que por isso chegou a ficar 15 a 20 horas dentro do trem sem banheiro. A testemunha disse ainda que apenas as locomotivas novas têm banheiros que funcionam quando chegam, mas que não é feita manutenção e que por isso, no caso de suas necessidades fisiológicas, ele “utiliza o ‘mato'”.
O colegiado afirmou que “é palmar que uma jornada de trabalho desse calibre não dispensa a existência de instalações sanitárias adequadas”, e que “os documentos juntados com a defesa não são capazes de convencer da existência dos banheiros, como alegado no recurso”. O acórdão salientou ainda que “as singelas fotografias impressas, sem indicação de data ou origem, não bastam a atestar que as locomotivas ali ilustradas eram as pilotadas pelo reclamante”.
Para o colegiado, trata-se de uma “situação degradante de trabalho, que atenta contra a dignidade do trabalhador”, situação que “se funda em conduta culposa da reclamada, que, por omissão, deixou de atender às normas de segurança e medicina do trabalho, especialmente no que toca às condições sanitárias mínimas, previstas na NR-24 do Ministério do Trabalho e Emprego”. A Câmara afirmou, assim, que “fica plenamente caracterizado o dano moral, o que autoriza a manutenção da sentença neste particular”.
Já quanto ao recurso do trabalhador, que trata do valor da indenização por danos morais, o acórdão ressaltou o fato de que, apesar de a maioria das máquinas pilotadas pelo operador não possuir banheiros em condições de uso, a própria testemunha afirmou que “em algumas locomotivas o banheiro funciona”. Para o colegiado, “a exposição do obreiro à situação vexatória tratada nos autos não ocorreu com a amplitude bradada no recurso, capaz de autorizar uma reparação na casa das centenas de milhares de reais”. Assim, concluiu que “o valor fixado pela origem, R$ 5 mil, apresenta-se insuficiente”, e fixou a reparação em R$ 10 mil, valor que “melhor atende aos parâmetros”.
Processo 0002370-21.2013.5.15.0044
Fonte: Noticias do Tribunal Regional do Trabalho da 15a Região – www.trt15.jus.br
Acordão na íntegra:
4ª CÂMARA
304- 4ª CÂMARA – Recurso Ordinário da VARA DO TRABALHO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO 2A (2370/2013), Acórdão nº 13798/2015-PATR Julgado em 10-MAR-15
Processo Nº RO-0002370-21.2013.5.15.0044
Complemento ( Numeração única: 0002370-21.2013.5.15.0044 RO )
Relator Relator: LUIZ JOSÉ DEZENA DA SILVA
1º Recorrente: Marcelo Jorge Honorio de Oliveira
2º Recorrente: ALL – América Latina Logística Malha Norte S.A.
CONHECER DO RECURSO DE M. J. H. DE O. E O PROVER EM PARTE, para fixar a indenização por danos morais em R$ 10.000,00, mantidos os parâmetros de apuração previstos em sentença, e CONHECER DO RECURSO DE ALL – AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA MALHA NORTE S.A. E O PROVER EM PARTE, para excluir da condenação as diferenças de horas extras, de horas de prontidão/sobreaviso e de adicional noturno, bem assim os reflexos respectivos, nos termos da fundamentação.
Para fins recursais, rearbitra-se a condenação em R$ 20.000,00, com custas de R$ 400,00 pela reclamada, já satisfeitas.
Votação unânime. E M E N T A (S) RECURSO ORDINÁRIO -DANO MORAL – RESTRIÇÃO DO USO DE BANHEIROS – LESÃO CONFIGURADA.
Constatado que a empregadora não fornecia instalações sanitárias exigidas pela NR-24 do MTE e que, ao contrário, obrigava os trabalhadores a realizar suas necessidades fisiológicas no mato que margeia a ferrovia, de forma claramente improvisada, impossível não se divisar o dano aos atributos personalíssimos do obreiro. A conduta da empresa atentou diretamente contra a dignidade da pessoa humana, protegida esta, como se sabe, constitucionalmente (art. 1º, inciso III, da CF).
Recurso patronal não provido no particular.